Pedido de liberdade do preso em tempos de coronavírus

A humanidade está passando talvez por um dos seus momentos mais difíceis em razão da pandemia do coronavírus COVID-19. Devido ao seu rápido poder de contaminação, vários segmentos de comércios foram obrigados a fechar as portas e a liberdade de ir e vir ficou limitada.

 

Segundo a OMS, uma das recomendações para reduzir a curva de contaminação é o isolamento social, isto é, reduzir o fluxo de pessoas em um mesmo espaço, evitando assim as aglomerações. Tal prática foi adotada em vários países e inclusive o nosso.

 

Já que uma das recomendações é evitar as aglomerações, como fica a situação dos presídios espalhados pelo Brasil? Como se sabe, nossa população carcerária é a terceira maior do mundo, e cerca de metade dos nossos presos são presos provisórios, ou seja, que ainda não possuem sentença condenatória com trânsito em julgado.

 

Nossos estabelecimentos prisionais são masmorras contemporâneas, tendo basicamente três ou quatro presos por vaga, a pena é cumprida em ambientes insalubres, sem ventilação, iluminação e etc. Há muitos presos com tuberculose, soropositivo, sarna, dentre outras doenças dividindo o mesmo espaço. O STF, na ADPF 347, considerou a situação carcerária brasileira como estado de coisas inconstitucional. Acontece que praticamente nada mudou depois do julgamento, para não dizer nada.

 

Uma pergunta que as mães, esposas e familiares de quem está preso faz é a seguinte, como buscar a liberdade do meu ente querido segregado nesse momento tão difícil? Por este motivo, é de suma importância que o advogado conheça a Recomendação de nº 62 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), pois sua redação será de extrema importância no momento de fundamentar o pedido de liberdade.

 

A referida recomendação, recomenda aos Tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus – Covid-19 no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo, por exemplo, o artigo 1º, inciso I da recomendação, contempla alguns presos que podem ser beneficiados com a prisão domiciliar, exemplo, idosos, gestantes, lactantes e doentes. Essas categorias de presos são consideradas como grupos de risco. Caso haja contaminação, podem ser levados rapidamente ao óbito.

 

Lembrando que a Recomendação 62 do CNJ, pode beneficiar tanto os presos provisórios como aqueles que já são condenados e estejam cumprindo pena, vejamos o artigo 4º e 5º:

 

Art. 4º Recomendar aos magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes medidas:

 

I – a reavaliação das prisões provisórias, nos termos do art. 316, do Código de Processo Penal, priorizando-se:

 

  1. a) mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco;

 

  1. b) pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, que estejam sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão do sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus;

 

  1. c) prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa) dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa;

 

II – a suspensão do dever de apresentação periódica ao juízo das pessoas em liberdade provisória ou suspensão condicional do processo, pelo prazo de 90 (noventa) dias;

 

III – a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias.

 

O artigo 4º recomenda que os juízes deverão analisar sobre as prisões preventivas de mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco. Deverá ainda dar prioridade para as pessoas presas em estabelecimentos prisionais com a capacidade máxima superada ou que não possua equipe médica, sobre a superlotação, hoje 99% das nossas prisões se encontram com a capacidade máxima ultrapassada.

 

O juiz analisará ainda aquelas prisões preventivas que já tenham excedido o prazo de 90 dias, ou seja, se o seu familiar está preso a mais de 3 meses, o juiz deve reanalisar os fundamentos usados para a manutenção da prisão preventiva, os presos que estão em liberdade e vão todo mês ao fórum assinar o livro e justificar as suas atividades não precisarão mais ir até segunda ordem, e deverá ser dada máxima excepcionalidade as novas ordens de prisão preventiva, tudo isso para fomentar o desencarceramento face a COVID-19.

 

O artigo 5º trata das medidas que devem ser adotadas pelos juízes da execução penal, dentre elas está, concessão de saída antecipada dos regimes fechado e semiaberto, sobretudo em relação às mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência e demais pessoas presas que se enquadrem no grupo de risco; concessão de prisão domiciliar em relação a todos as pessoas presas em cumprimento de pena em regime aberto e semiaberto, mediante condições a serem definidas pelo Juiz da execução.

 

Para conseguir o máximo de sucesso no pedido, é necessário o advogado se atentar há alguns pontos, a documentação que irá instruir a nossa petição e a procuração, exemplo, se for um preso doente, deve ser juntado exames médicos, laudos, receitas etc. É sempre preferível pecar pelo excesso para não perder tempo, junte tudo que for necessário para provar o que está sendo alegado.

 

Sobre a procuração, muitos presídios estão com o atendimento suspenso por conta da pandemia, o que impede o advogado de acessar o cliente para conversar e pegar a respectiva procuração. Nos termos do artigo 4º, §5º do Código de Ética e Disciplina da OAB, é direito do advogado peticionar sem procuração em face a urgência, podendo juntar a mesma com quinze dias prorrogados por igual período. Considero importante que o advogado abra um tópico e coloque o dispositivo legal com a referida fundamentação na peça processual, tudo isso para não haver o risco de indeferimento por ausência de instrumento procuratório.

 

Se no seu caso concreto, você perceber que mesmo o seu cliente sendo enquadrado nos requisitos da Recomendação 62 do CNJ, que ele ainda não possui requisitos para a prisão preventiva, ou que já há o excesso de prazo por conta do adiamento da audiência, alegue tudo para somar com a recomendação, tudo o que favorecer o cliente vale a pena ser alegado. Peça subsidiariamente a aplicação de medidas cautelares diversa da prisão, como o uso de monitoramento eletrônico.

 

Fale sobre o suposto crime praticado, demonstre ao juiz que não envolveu violência ou grave ameaça, fale ainda a respeito dos antecedentes e primariedade se houver.

 

Análise a jurisprudência, a começar pela do STF, STJ e TJ do seu e dos demais estados, procurar por casos semelhantes ao seu é fundamental, o objetivo é demonstrar ao juiz que, nessa situação específica, ele deve julgar da mesma forma que julgou os outros casos similares, por conta do princípio da isonomia.

 

Por fim, contrate sempre sempre um advogado experiente e que atue na área criminal para fazer uma análise minuciosa do caso concreto. Recomendo a todos que se interessarem pelo assunto, que leiam na íntegra a  Recomendação de nº 62 do CNJ, bons estudos!