A Progressão de Regime para os delitos hediondos e/ou equiparados após a entrada em vigor da Lei 13.964/2019
A progressão de regime é a transferência do apenado do regime mais grave para o mais brando, desde que cumprida determinada parcela da pena e ostente bom comportamento carcerário.
Com a entrada em vigor do pacote Anticrime, Lei 13.964/2019, a Lei de Execução Penal sofreu grandes alterações no que diz respeito à progressão de regime, porém, essas mudanças possuem algumas lacunas, o que gera confusão na cabeça dos apenados e seus familiares, especialmente nos casos dos indivíduos reincidentes condenados pela prática de crimes hediondos.
Antes da entrada em vigor do pacote Anticrime, a progressão de regime para aqueles que cometeram crimes hediondos era regulada pela Lei 8.072 de 1990 (Lei de crimes hediondos), que exigia a fração de 2/5 da pena se primário e 3/5 caso fosse reincidente, independente se o crime anterior era comum ou hediondo.
Contudo, já há precedentes no STJ no sentido de que o condenado por crime hediondo que seja reincidente só deve cumprir a fração maior para a progressão se a reincidência for específica. Caso contrário, deve cumprir a fração correspondente ao condenado primário, tendo em vista que a lei não traz regra própria para sua situação:
Sobre o tema, vejamos o informativo 681 do STJ:
‘’Firmou-se no Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que, nos termos da legislação de regência, mostra-se irrelevante que a reincidência seja específica em crime hediondo para a aplicação da fração de 3/5 na progressão de regime, pois não deve haver distinção entre as condenações anteriores (se por crime comum ou por delito hediondo) (AgRg no HC n. 494.404/MS, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 20/5/2019).
Contudo, tal entendimento não pode mais prevalecer diante da nova redação do art. 122 da Lei de Execução Penal, trazida com a Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime).
Com efeito, a Lei de Crimes Hediondos não fazia distinção entre a reincidência genérica e a específica para estabelecer o cumprimento de 3/5 da pena para fins de progressão de regime, é o que se depreende da leitura do § 2º do art. 2º da Lei n. 8.072/1990: A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal).
Já a Lei n. 13.964/2019 trouxe significativas mudanças na legislação penal e processual penal, e, nessa toada, revogou o referido dispositivo legal. Agora, os requisitos objetivos para a progressão de regime foram sensivelmente modificados, tendo sido criada uma variedade de lapsos temporais a serem observados antes da concessão da benesse.
A leitura da atual redação do dispositivo em comento revela, porém, que a situação em exame (condenado por crime hediondo, reincidente não específico) não foi contemplada na lei. Vejamos: Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: […] V – 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; VI – 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for: a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional; […] VII – 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado; VIII – 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.
Dessa forma, em relação aos apenados que foram condenados por crime hediondo mas que são reincidentes em razão da prática anterior de crimes comuns não há percentual previsto na Lei de Execuções Penais, em sua nova redação, para fins de progressão de regime, visto que os percentuais de 60% e 70% se destinam unicamente aos reincidentes específicos, não podendo a interpretação ser extensiva, vez que seria prejudicial ao apenado. Assim, por ausência de previsão legal, o julgador deve integrar a norma aplicando a analogia in bonam partem.
No caso (condenado por crime hediondo com resultado morte, reincidente não específico), diante da lacuna na lei, deve ser observado o lapso temporal relativo ao primário. Impõe-se, assim, a aplicação do contido no inciso VI, a, do referido artigo da Lei de Execução Penal, exigindo-se, portanto, o cumprimento de 50% da pena para a progressão de regime’’.
Desta forma, se caso uma pessoa é condenada por um crime de furto (crime comum) e posteriormente pratica um crime de tráfico de drogas (crime considerado hediondo), esta deve progredir após o cumprimento de 40% da sua pena, haja vista que as alterações feitas pelo pacote Anticrime na Lei de Execução Penal não trazem nenhuma situação específica da reincidência em crime comum, somente a reincidência específica em crime hediondo, nos termos do artigo 112, inciso VI e VII. da LEP.
Da mesma forma, se a pessoa é condenada pela prática do crime de homicídio, mas é reincidente em um crime comum, por exemplo a receptação, não há como aplicar a fração 60% para a progressão de regime, tendo em vista que, de acordo com o artigo 112, inciso VII da LEP, tal fração somente é aplicável a agentes que sejam reincidentes na prática de crime hediondo ou equiparado, portanto, diante da lacuna na lei, deve ser aplicado a analogia in bonan partem, aplicando a fração de 50% da pena privativa de liberdade, por não se tratar de reincidente específico em crime hediondo com resultado morte.