EXCESSO DE LINGUAGEM NA DECISÃO DE PRONÚNCIA.

Para quem não sabe, a pronúncia é a decisão proferida pelo juiz que determina que o réu será julgado no tribunal do júri.

 

Contra a decisão de pronúncia cabe o recurso em sentido estrito, esgotada a via recursal, será a iniciada a segunda fase do júri, que é o plenário.

 

A decisão de pronúncia que encaminha o réu ao tribunal do júri deve ser fundamentada, conforme orientação da nossa própria Constituição Federal, contudo, por ser um procedimento bifásico, o juiz ao pronunciar o acusado deve-se atentar para não condenar préviamente o mesmo, pois ele não é competente para o julgamento, e sim os jurados.

 

Esse cuidado especial na fundamentação da decisão de pronúncia é para o juiz não influenciar e contaminar os jurados, que por serem leigos, são facilmente influenciados pelas decisões proferidas por um juiz, pessoa de respeito na sociedade.

 

Vejamos o que diz o artigo 413, §1º  do Código de Processo Penal:

Art. 413.  O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

§ 1o  A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.

 

Observado o artigo acima mencionado, deve o juiz no momento de pronunciar o réu, se limitar a indicação da existência do crime (materialidade) e a existência de indícios suficientes de participação e autoria, neste momento o juiz não pode afirmar a autoria nem a materialidade, pois isso conduziria a um pré julgamento por parte dos jurados.

 

A pronúncia não é o momento para juízo de valores, o juiz não deve exteriorizar suas certezas, sob pena de influenciar no julgamento.

 

A preocupação foi tanta com a imparcialidade dos jurados que em 2008 entrou em vigor a lei 11.689, que criou o artigo 478 do Código de Processo Penal, vejamos:

Art. 478.  Durante os debates as partes não poderão, sob pena de     nulidade, fazer referências:

I – à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado.

 

Com a entrada em vigor do artigo 478 do CPP, o que se pretende evitar são os exageros do juiz na decisão de pronúncia e o uso abusivo por parte do promotor dessa decisão durante o julgamento no plenário.

 

Sobre o tema, vejamos alguns julgados do TJ/GO:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO. TENTATIVA. LESÃO CORPORAL. ARMA. PORTE. ILEGAL. NULIDADE. LINGUAGEM. EXCESSO.  Enseja nulidade por excesso de linguagem a decisão de pronúncia que expressa juízo de certeza sobre autoria, apresentando afirmações incisivas da conduta do agente e até refutando teses da defesa. Recurso provido. Pronúncia anulada.
(TJGO, RECURSO EM SENTIDO ESTRITO 468594-29.2014.8.09.0084, Rel. DES. IVO FAVARO, 1A CAMARA CRIMINAL, julgado em 13/09/2018, DJe 2610 de 17/10/2018) (grifo nosso)

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA. VÍCIO. FUNDAMENTAÇÃO. LINGUAGEM. EXCESSO. NULIDADE. DE OFÍCIO. Incorre em vício de fundamentação o ato judicial que analisa as teses apresentadas pela defesa de maneira invertida para cada um dos corréus, e excede ao emitir juízo de valor e extrapola os limites da tecnicalidade, incursionando indevidamente no mérito reservado ao Conselho de Sentença. Recurso conhecido e, de ofício, anulada a decisão, prejudicado o mérito recursal.
(TJGO, RECURSO EM SENTIDO ESTRITO 290299-12.2010.8.09.0083, Rel. DES. IVO FAVARO, 1A CAMARA CRIMINAL, julgado em 16/08/2018, DJe 2609 de 16/10/2018) (grifo nosso)