GATONET É CRIME?
Antes de entrarmos no assunto devemos analisar o artigo 155 do Código Penal, que tipifica o crime de furto:
Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
No mesmo artigo 155, em seu parágrafo 3º, o legislador equiparou a coisa alheia móvel a energia elétrica, vejamos:
§ 3º – Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.
Feita essa observação, podemos chegar a conclusão de que o ‘gato’ na energia é tipificado como crime de furto, mas é o ‘gatonet’, também poderia ser equiparado a energia elétrica para punir aquele que intercepta sinal de TV a cabo?
Por ser o ‘gatonet’ uma situação corriqueira e muita das vezes aceitável na sociedade, a discussão chegou até o STF, que consolidou-se no sentido de que aquele que intercepta sinal de TV a cabo de maneira clandestina, não pode ser punido nos termos do art. 155, parágrafo 3º do Código Penal, já que não se pode admitir a interpretação extensiva de caracterizar o sinal de TV como energia, vejamos:
EMENTA: HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE RECURSAL DO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. INTERCEPTAÇÃO OU RECEPTAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE SINAL DE TV A CABO. FURTO DE ENERGIA(ART. 155, § 3º, DO CÓDIGO PENAL). ADEQUAÇÃO TÍPICA NÃO EVIDENCIADA. CONDUTA TÍPICA PREVISTA NO ART. 35 DA LEI 8.977/95. INEXISTÊNCIA DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. APLICAÇÃO DE ANALOGIA IN MALAM PARTEM PARA COMPLEMENTAR A NORMA. INADMISSIBILIDADE. OBEDIÊNCIA A O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA ESTRITA LEGALIDADE PENAL. PRECEDENTES. O assistente de acusação tem legitimidade para recorrer de decisão absolutória nos casos em que o Ministério Público não interpõe recurso. Decorrência do enunciado da Súmula 210 do Supremo Tribunal Federal. O sinal de TV a cabo não é energia, e assim, não pode ser objeto material do delito previsto no art. 155, § 3º, do Código Penal. Daí a impossibilidade de se equiparar o desvio de sinal de TV a cabo ao delito descrito no referido dispositivo. Ademais, na esfera penal não se admite a aplicação da analogia para suprir lacunas, de modo a se criar penalidade não mencionada na lei (analogia in malam partem), sob pena de violação ao princípio constitucional da estrita legalidade. Precedentes. Ordem concedida. (HC 97261, Relator (a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 12/04/2011, DJe-081 DIVULG 02-05-2011 PUBLIC 03-05-2011 EMENT VOL-02513-01 PP-00029 RTJ VOL-00219- PP-00423 RT v. 100, n. 909, 2011, p. 409-415).
No referido julgado o STF menciona que a conduta de interceptação de sinal de tv a cabo não se amolda ao delito do artigo 155, §3º do CP, e sim ao artigo 35 da Lei 8.977/95, que dispões sobre os serviços de tv a cabo, vejamos:
Art. 35. Constitui ilícito penal a interceptação ou a recepção não autorizada dos sinais de TV a Cabo.
Ocorre que o crime tipificado no artigo 35 da referida lei carece de preceito secundário, pois o legislador previu um tipo penal mas não cominou uma sanção penal, portanto a conduta é atípica.
Neste caso estamos diante de uma norma penal em branco, pois não há complemento normativo que diz respeito a sanção, e inexistindo tal norma, não se pode admitir a aplicação da analogia in malam partem para punir o agente.