A CONDUTA DO FOGUETEIRO É CRIME?
Como todos sabem, o tráfico de drogas é considerado crime em nosso país e vem tipificado no artigo 33 da lei 11.343 de 2006, mais conhecida como Lei de Drogas.
Vocês já devem ter ouvido falar, ou viram em algum filme ou na televisão, sobre o fogueteiro, que muitas das vezes solta os fogos de artifício ou empina pipas para avisar a chegada da polícia na comunidade.
Ocorre que o fogueteiro em tese não pratica o tráfico de droga, apenas avisa os traficantes da chegada da polícia, essa conduta será que é crime?
Para responder a essa pergunta, recorremos a própria Lei de Drogas, que no seu artigo 37 diz que é crime, colaborar como informante de organização ou associação destinada ao tráfico. A lei é clara, pois a colaboração deve ser como informante, o que significa dizer que o auxílio deve estar restrito ao fornecimento de informações que de alguma forma contribuam para o tráfico, é o que ocorre com o fogueteiro, que avisa os traficantes da chegada da polícia.
Antes da atual Lei de Drogas, o fogueteiro responderia pelo tráfico de drogas, nos termos do artigo 29 do Código Penal, pois quem concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas. Já a atual lei passou a regular a conduta no artigo 37.
Para que o informante seja enquadrado no artigo 37 da lei 11.343 de 2006, as informações por ele prestadas devem ter relevância para contribuir de qualquer modo com a continuidade do tráfico de drogas, pois se a informação repassada for irrelevante, restará prejudicado o nexo causal e será reconhecida a atipicidade da conduta.
O artigo 37 que tipifica a conduta do informante diz que ela deve ser prestada a grupo, organização ou associação, mas e se o fogueteiro passa informações relevantes a um único traficante, ainda sim responderia pelo crime?
Pelo princípio da isonomia não podemos responsabilizar o informante se este presta informações a um único traficante em isolado, pois o artigo 37 traz pena de 2 a 6 anos para quem fornece informações a grupos, organizações e associações, ao passo que se este presta informações a um único traficante, se sujeitará a pena do tráfico, artigo 33, que é de 5 a 15 anos.
Desta forma, alguns doutrinadores dos quais pactuamos com o entendimento dizem que é perfeitamente possível a aplicação da analogia in bonam partem, para concluirmos que o crime do artigo 37 abrange também o traficante individual.
Vejamos o julgado do TJ-SC sobre o tema:
APELAÇÃO CRIMINAL. COLABORAÇÃO, COMO INFORMANTE, EM ASSOCIAÇÃO DESTINADA À PRÁTICA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (LEI 11.343/06, ART. 37). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO. 1. ABSOLVIÇÃO. 1.1. ADEQUAÇÃO TÍPICA. COLABORAÇÃO COMO INFORMANTE. ÚNICO TRAFICANTE. ANALOGIA IN BONAM PARTEM. 1.2. AUTORIA E MATERIALIDADE. PALAVRAS DOS POLICIAIS CIVIS. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. 2. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. ÓBICE LEGAL (CP, ART. 44, II e III). 3. HONORÁRIOS RECURSAIS (CPC, ART. 85, §§ 1º E 11). ARBITRAMENTO POR EQUIDADE (CPC, ART. 85, § 2º E 8º). 1.1. Em que pese o tipo penal consagrado no art. 37 da Lei 11.343/06 faça expressa referência a grupo, organização ou associação, a doutrina recomenda, por meio da analogia in bonam partem, que a figura contemple, também, o informante que colabore eventualmente com um único traficante, pois, caso contrário, deveria o agente responder como partícipe do crime de tráfico de drogas (CP, art. 29). 1.2. Os depoimentos dos policiais civis, no sentido de que o acusado admitiu que exerceu a função de “olheiro” para o traficante local na noite anterior aos fatos, aliados à confissão extrajudicial e às declarações do corréu, são provas suficientes da autoria e da materialidade delitivas, a ponto de justificar sua condenação pela prática da infração penal do art. 37 da Lei 11.343/06. 2. Não é socialmente recomendável a substituição da pena privativa de liberdade imposta a agente que ostenta maus antecedentes e é multi reincidente em crime contra o patrimônio. 3. Faz jus à remuneração fixada de modo equitativo, em razão do trabalho adicional realizado em grau recursal, a defensora nomeada para atuar durante a instrução da ação que apresenta as razões do apelo. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE; DE OFÍCIO, COMPENSADA A ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONT NEA COM A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA, ESTENDENDO-SE IDÊNTICA PROVIDÊNCIA A UM DOS CORRÉUS NÃO RECORRENTE.
Por último, como o crime do artigo 37 faz menção a informação, podemos concluir que o delito se consuma no momento que a informação chegar no destinatário.