A LEI MARIA DA PENHA PROTEGE AS AMANTES ?
Como todos sabem, a Lei Maria da Penha veio para resguardar a mulher que é vítima de violência doméstica ou familiar.
O artigo 5º da referida lei, diz que:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.
O inciso II do artigo acima mencionado, diz que a família é compreendida como a unidade formada pelos indivíduos que se consideram parentes, unidos por laços sanguíneos ou afetivos.
Neste conceito, se encaixa no referido entendimento de família os mais diversos tipos familiares, seja esta formada pelo casamento, pela união estável, ou por qualquer dos pais e seus dependentes, por irmãos, por filhos de criação, por uniões homoafetivas, etc.
Atualmente é importante destacar a existência de famílias paralelas, que são os relacionamentos mantidos concomitantemente, que na maioria das vezes é exercido em segredo pelo homem, ou não.
Desta forma, se existem duas famílias com vínculos distintos mas com o mesmo integrante em comum, se por exemplo o homem adúltero agredir qualquer uma das mulheres, o fato de a outra união ser rotulada como ‘traição/amante’ não exclui a vítima do âmbito de proteção da Lei Maria da Penha.
Nesse sentido, vejamos o seguinte julgado do STJ:
HABEAS CORPUS Nº 310.151 – RS (2014/0312155-9) RELATOR : MINISTRO FELIX FISCHER IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PACIENTE : CRISTIANO BARBOSA FERNANDES DECISÃO Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de CRISTIANO BARBOSA FERNANDES, contra v. acórdão prolatado pelo eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Aduz a Defensoria Pública que o eg. Tribunal de origem incorreu em equívoco ao entender pela aplicação, no caso, da Lei n. 11.340/06 (Lei Maria da Penha). Em apertada síntese, sustenta que as supostas agressões morais praticadas pelo ora paciente teriam sido dirigidas contra todo o núcleo familiar, inclusive avô e tio, e não apenas contra a avó. O pedido de medida liminar foi indeferido (fl. 74/75, e-STJ). A d. Subprocuradoria-Geral da República opinou pela denegação da ordem de habeas corpus, em parecer que possui a seguinte ementa (fl. 100, e-STJ): “PENAL. HABEAS CORPUS. INJÚRIA QUALIFICADA EM MBITO DOMÉSTICO. CORRETA A INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA AO CASO. 1. Neste habeas corpus, o impetrante pede para que seja cassado o acórdão recorrido, de modo a afastar a incidência da Lei Maria da Penha na espécie. 2. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao analisar as particularidades e peculiaridades do caso, deu parcial provimento ao recurso do Ministério Público, para determinar a incidência da Lei nº 11.340/2006, apenas quanto à ofendida, avó do paciente, por haver, em tese injúria qualificada direcionada especificamente a ela. 3. O âmbito de aplicação da Lei nº 11.340/2006 não se restringe aos conflitos envolvendo relação conjugal. Trata- se de Lei que visa a proteger e coibir a violência baseada em gênero na esfera de violência doméstica e familiar. 4. Assim, considerando a relação de convivência existente, bem como a suposta condição de vulnerabilidade, mesmo que física, ostentada pela vítima Leida, avó do paciente, impõe-se a incidência da Lei Maria da Penha no caso, para oferecer maior proteção à ofendida, nos termos da jurisprudência dessa Corte Superior. (Precedente). – Parecer pela denegação da ordem de habeas corpus.” É o breve relatório. Decido. A Primeira Turma do col. Pretório Excelso firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus substitutivo ante a previsão legal de cabimento de recurso ordinário (v.g.: HC n. 109.956/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 11/9/2012; RHC n. 121.399/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 1º/8/2014 e RHC n. 117.268/SP, Rel. Ministra Rosa Weber, DJe de 13/5/2014). As Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte alinharam-se a esta dicção, e, desse modo, também passaram a repudiar a utilização desmedida do writ substitutivo em detrimento do recurso adequado (v.g.: HC n. 284.176/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 2/9/2014; HC n. 297.931/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 28/8/2014; HC n. 293.528/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe de 4/9/2014 e HC n. 253.802/MG, Sexta Turma, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 4/6/2014). Portanto, não se admite mais, perfilhando esse entendimento, a utilização de habeas corpus substitutivo quando cabível o recurso próprio, situação que implica o não-conhecimento da impetração. Contudo, no caso de se verificar configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, recomenda a jurisprudência a concessão da ordem de ofício. Destarte, passo ao exame das razões veiculadas no mandamus. Na hipótese, não há qualquer ilegalidade que justifique a concessão da ordem de ofício. Com efeito, nos termos da d. manifestação do Ministério Público, “o âmbito de aplicação da Lei 11.340/06 não se restringe aos conflitos envolvendo relação conjugal. Trata-se de Lei que visa a proteger e coibir a violência baseada em gênero na esfera de violência doméstica e familiar. Assim, considerando a relação de convivência existente, bem como a suposta condição de vulnerabilidade, mesmo que física, ostentada pela vítima Leida, avó do paciente, impõe-se a incidência da Lei Maria da Penha no caso, para oferecer maior proteção à ofendida” (fl. 105, e-STJ). Nesse sentido: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO.VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. MAUS TRATOS E INJÚRIA SUPOSTAMENTE PRATICADOS CONTRA GENITORA. INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA. INEXISTENTE MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL. (…) 2. A Lei Maria da Penha objetiva proteger a mulher da violência doméstica e familiar que, cometida no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto, cause-lhe morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, e dano moral ou patrimonial. 3. Estão no âmbito de abrangência do delito de violência doméstica e podem integrar o polo passivo da ação delituosa as esposas, as companheiras ou amantes, bem como a mãe, as filhas, as netas do agressor e também a sogra, a avó ou qualquer outra parente que mantém vínculo familiar ou afetivo com ele. 4. No caso dos autos, não há ilegalidade evidente a ser reparada, pois mostra-se configurada a incidência da Lei n. 11.343/2006, nos termos do art. 5º, I, ante os relatados maus tratos e injúria em tese sofridos pela mãe do suposto agressor.5. Habeas corpus não conhecido.”(HC 310.154/RS, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe 13/05/2015, grifei) HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL. WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. DESVIRTUAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.COMPETÊNCIA.VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO ENTRE AUTORES E VÍTIMA. COABITAÇÃO. DESNECESSIDADE.INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. (…) 3. A Terceira Seção deste Superior Tribunal afirmou que o legislador, ao editar a Lei Maria da Penha, teve em conta a mulher numa perspectiva de gênero e em condições de hipossuficiência ou inferioridade física e econômica em relações patriarcais. Ainda, restou consignado que o escopo da lei é a proteção da mulher em situação de fragilidade/vulnerabilidade diante do homem ou de outra mulher, desde que caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade (CC n. 88.027/MG, Ministro Og Fernandes, DJ 18/12/2008). 4. A intenção do legislador, ao editar a Lei Maria da Penha, foi de dar proteção à mulher que tenha sofrido agressão decorrente de relacionamento amoroso, e não de relações transitórias, passageiras, sendo desnecessária, para a comprovação do aludido vínculo, a coabitação entre o agente e a vítima ao tempo do crime. (…) 6. Para a incidência da Lei Maria da Penha, faz-se necessária a demonstração da convivência íntima, bem como de uma situação de vulnerabilidade da mulher, que justifique a incidência da norma de caráter protetivo, hipótese está configurada nos autos. (…) 8. Habeas corpus não conhecido. (HC 181.246/RS, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe 06/09/2013, grifei) Assim, por não vislumbrar nos autos a ocorrência de flagrante ilegalidade que justificasse a concessão da ordem de ofício, não conheço do presente habeas corpus. P. e I. Brasília (DF), 24 de junho de 2015. Ministro Felix Fischer Relator.